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  • Foto do escritorDaniel Marcondes

De aprendiz a inventor

Descendente de japonês de 73 anos mostra que nem sempre o ensino formal é a melhor das opções.

Armando Horikawa olha para a sua invenção como um pai enxerga o filho com amor fraterno. © Daniel Marcondes

Conhecer é uma das coisas que move o ser humano. Nascemos sem saber andar, sem falar e muito menos sem saber o mundo dos cálculos. Por isso talvez, a nostalgia do início da vida acadêmica pode causar boas lembranças a maioria das pessoas. A primeira professora. Os primeiros amigos. E as típicas brincadeiras de criança. Momentos que fazem parte de um tempo que não volta mais. Uma parte da história apenas acessível pelo curto caminho eternizado pela memória.


É inegável também que dentro de uma sala de aula existem diferentes perspectivas de vida e aptidões para o estudo. Vai dizer que na sua sala não tinha aquele menino mais bagunceiro? Ou aquela colega mais falastrona? E o que dizer de uma pessoa que levou sete anos para concluir os quatro anos iniciais do ensino fundamental? Pois é, pode parecer que não passaria de mais um daqueles conhecidos repetentes, mas dessa vez não foi bem assim.


A verdade é que Armando Shoshin Horikawa não era dos mais adeptos do ensino formal. Nunca gostou de estudar e muito menos de ler, por isso não se encontrou nos bancos escolares. Por incrível que pareça, isso não fez falta a ele. O senhor franzino, de vestes simples, é graduado na maior das faculdades: a vida.


Com 73 anos, as marcas da idade já são comuns por todo o corpo de seu Armando. As veias saltadas são como lembretes de que o tempo é implacável e faz com que não se esqueça de todo esforço já feito até ali para eternizar sua história na cidade. Venceu na vida ao tornar presente no município dezenas de seus inventos e propagar o conhecimento que tem às novas gerações.


Ele constrói de tudo. Até mesmo miniaturas de fórmula um, completamente funcionais: com suspensão ativa e volante que esterça. © Daniel Marcondes

Mestre de várias funções, Armando já fez de quase tudo nessa vida. De peixeiro a eletricista. De mecânico a marceneiro. De aprendiz a inventor. Foi em um curso do Senai que ele descobriu sua aptidão. Lá ele desenhava peças e nunca tirou menos do que 9,0 nos trabalhos. Os professores ficavam admirados com a facilidade e sempre queriam deixar as peças dele expostas no lugar. Chamava a atenção o fato de um menino repetente ter se transformado naquele aluno de ponta.


Foi lá que ele aprendeu o ofício da invenção. Nunca mais parou. Cada vez galgava mais espaço nas indústrias da cidade como criador de máquinas. Havia conseguido juntar tudo aquilo que tinha aprendido até ali e construía uma nova história: a sua história. Fez carreta, ponte, elevador, de tudo um pouco nessa vida aliando elétrica e hidráulica. Eram outros tempos, em que o computador nem era imaginado e a superficialidade das relações não tinha vez.


Nascido no ano de término da segunda guerra, em Londrina, seu Armando resolveu ir ao oriente, à terra de seus pais, na busca de um futuro melhor. Entre idas e vindas, ficou doze anos por lá. Aproveitou o fim do “milagre econômico” japonês, na década de 90. Conseguiu comprar a casa em que vive hoje e dar uma vida mais confortável para sua família, ganhando muito mais do que poderia imaginar no Brasil.


Um dos inventos do Sensei: Uma moto anfíbia que consegue andar em terra firme e navegar em águas profundas. © Daniel Marcondes

De uma fala mansa e um jeito humilde, seu armando tem pós-graduação na criação de dois filhos, ambos empresários. Talvez por influência do pai, eles também queriam mostrar ao mundo o que tinham de melhor inventando novas formas de fazer negócio, sem estar condicionado ao comodismo de um emprego formal.


Armando também é conhecido como Sensei Horikawa. Não é à toa que ele é considerado o primeiro professor de Judô de Cascavel. Quando se mudou para o oeste paranaense só haviam judocas de faixa marrom, enquanto ele vindo de Londrina, já tinha a faixa do grau mais alto. Na tentativa de manter viva sua história, está no esporte até hoje, com mais de 50 anos de faixa.


Continua com a atividade física no dia a dia para não dar chance aos problemas de saúde e ainda assim causa surpresa nos mais desavisados. Não é difícil ser derrotado pelo Sensei Horikawa, do alto de seu 1,55 metro e 45 quilos. É só mais uma prova de técnica e conhecimento são tudo nessa vida. Sabendo como fazer se vai longe.


A mão calejada pela vida sofrida não esconde quem é Armando Horikawa. © Daniel Marcondes

Foi por conta da curiosidade que seu Armando já construiu até uma casa, como se o que tivesse feito até aqui não fosse suficiente. Não estava satisfeito com a qualidade do serviço dos pedreiros que já tinha contratado e resolvera ele mesmo ir a campo. Para isso observara e aprendera por semanas até se sentir seguro para a lida. O resultado está lá de pé no mesmo lugar depois de 18 anos de concepção, sem maiores alterações. Deu certo afinal. Bem diferente da residência de um vizinho construída pouco tempo depois. O lugar já passou por várias reformas, como se mostrasse sua fragilidade escancaradamente para quem quisesse ver.


Quem não esconde seus feitos também é o Sensei Horikawa. É comum ver ele pelas ruas dos bairros de Cascavel com sua moto anfíbia movida pela força do vento. Também é com alegria que ele mostra um pouco das invenções que tem no seio de seu lar na manhã de uma terça-feira. O ambiente faz jus ao chefe da família e os pássaros ao fundo dão enfoque no ar de sossego daquele lugar. A caixa de ferramentas da década de 70 que ele tem lá cheia de criações é como uma porta ao passado. Ao abri-la, seu Armando traz à tona um tempo de nostalgia e só reforça aquilo que o move até hoje: “Eu não faço coisas na dúvida de que vai funcionar, só na certeza de que vai dar certo”, afirma Sensei Horikawa.

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